Um blog criado a 4 mãos, uma parceria entre irmãs, para comentarmos sobre os livros que lemos, e compartilhar opções de boa leitura.
Escolha um livro, pegue uma xícara de café e venham me desfolhar, sintam-se à vontade.

terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Quatro histórias de ladrão (e outras crônicas)

Título: Quatro histórias de ladrão (e outras crônicas.)
Autor: Paulo Mendes Campos
Gênero: Crônicas
Editora: Agir
Páginas: 109
Ano: 2005











Bem vindos ao Rio de Janeiro de Paulo Mendes Campos, cronista da boemia da cidade.
O livro contrasta entre histórias 
chatas e cansativas e outras muito boas que fazem a leitura valer a pena, algumas intrigantes e até cômicas, como as 4 histórias de ladrão, uma delas, a citada a baixo:

Indo à cidade em dia de festa, teve a bolsa roubada, com todas as jóias dentro. No dia seguinte, desesperada das providências policiais, recebeu um telefonema:
- É a madame de quem roubaram a bolsa ontem?
- Sim.
- Aqui é o ladrão, madame.
- Mas como o... o senhor descobriu o meu número?
- Olhei primeiro na carteira de identidade e depois consultei a lista telefônica.
- Ah, é verdade. E quanto quer para devolver minhas... Meus objetos?
- Nada, madame.
- Não estou entendendo.
- Acontece o seguinte: sou um homem casado...
- Pelo fato de ser casado, não precisa andar roubando. Onde estão as minhas jóias, seu sujeito ordinário?
- Vamos com calma, madame. Preste atenção: só ontem, por um descuido meu, minha mulher descobriu quem eu sou realmente. A senhora não imagina o drama que foi lá em casa.
- Escute uma coisa, eu não estou para ouvir graçolas de um ladrão descarado...
- Não é graçola, madame. O caso é que gosto mesmo da minha mulher.
- E que é que eu tenho com  isso? O que me interessa são as jóias e a carteira de identidade (dá um trabalho danado tirar outra), e não tenho a mínima com a sua vida particular. Quero aquilo que é meu só.
- Claro, madame, claro. Estou telefonando por isso. Imagine a senhora que minha mulher ameaçou ir pra casa da mãe dela se eu não me regenerar imediatamente...
- Inocentezinha! Ir num papo desses.
- Pois eu prometi para ela, nunca mais roubar em minha vida.
- E ela bancou a pateta de acreditar?
- Tenho minhas dúvidas. Mas, o que eu prometo, cumpro; sou um homem de palavra.
- Essa é fina: um ladrão de palavra! As minhas jóias naturalmente já foram vendidas. Qual afinal é sua jogada?
- As jóias estão em meu poder, madame.
- E quanto quer por elas? Diga logo.
- Não estou vendendo, madame, quero devolvê-las. Infelizmente, minha mulher disse que só acreditaria em minha regeneração se eu lhe devolvesse as jóias. Depois ela vai bater um fio pra senhora e checar.
- Pois fique sabendo de uma coisa: se isso não for alguma palhaçada de sua parte, sua senhora está de parabéns. Pena uma pessoa de tanto caráter estar casada com um... Fora da lei.
- É também o que eu acho. Mas gosto tanto dela que estou disposto a qualquer sacrifício.
- Então parabéns igualmente para o sr. Vai trazer-me as jóias aqui?
- Negativo madame; A senhora pode fazer uma suja.
- Uma o quê?
- A senhora pode chamar a polícia.
- Prometo que não chamo, não por sua causa, por sua senhora.
- Nessa eu não embarco de jeito nenhum madame.
- Também sou uma mulher de palavra.
- O caso madame, é que nós, os desonestos, não acreditamos na palavra dos honestos. Morou?
- Tá. Mas como o senhor pretende fazer então?
- Estou bolando um jeito de lhe mandar as jóias sem perigo para mim e sem que outro ladrão possa roubá-las. A senhora não tem uma idéia?
- O senhor entende mais disso do que eu.
- É verdade. Tenho um plano: eu lhe mando umas flores com as jóias dentro dum pequeno embrulho.
- Não seria melhor eu encontrá-lo numa esquina?
- Negativo! Tenho meu pudor, madame.
- Mas não há perigo de mandar coisas de valor para uma casa de flores?
- Não. Vou seguir o entregador a uma certa distância.
- Então, vou ficar esperando. Não se esqueça da carteira, por favor.
- Dentro de uns vinte minutos está tudo aí.
- Bem, sendo assim, muito agradecida. O sr até que se parece com o bom ladrão. Recomendações para sua senhora.
Dentro do prazo marcado, um menino confirmava, que em certas ocasiões, até os ladrões mandam flores e jóias.

segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

Por um fio

Título: Por um fio
Autor: Drauzio Varella
Editora: Companhia das letras
Gênero: Ciências humanas
Páginas: 218
Ano: 2004









Nesse livro, Drauzio Varella retrata seus 30 anos de convívio com pacientes em fase terminal. Relata histórias de pessoas diagnosticadas com câncer ou HIV, pessoas que sobreviveram, outras que não tiveram a mesma chance, pessoas que lutaram, outras que preferiram morrer ao viver com limitações e sofrimento. A reação das pessoas diante da possibilidade, muitas vezes quase certa da morte, como a visão das pessoas mudam; suas relações afetivas, seus valores, os bens materiais, o significado das coisas, como o importante pode se tornar supérfluo e vice versa "Um doente que não consegue se alimentar há uma semana é capaz de chorar de emoção ao conseguir engolir 3 colheres de sopa de mandioquinha; outro comemora a proeza de conseguir andar até o banheiro com a alegria de quem ganhou a maratona de New York. Só quem padece de dores continuas conhece o prazer de passar duas horas sem ela."
Drauzio descreve também a reação dos familiares, pessoas que se dedicam por completo ao ente querido, outros que mal vão visitar, filhos que desejam que os pais morram logo para não lhes dar trabalho ou para de apropriar dos bens, o marido que se casa com a cunhada após a morte da esposa, casais mesquinhas que não se desprendem de bens materiais pela vida ou conforto do conjugue, na maioria, pessoas com grande poder aquisitivo. Drauzio relata que aprendeu a dar mais valor aos gestos do que as palavras dos doentes e das pessoas que os cercam, e que talvez as únicas palavras confiáveis sejam as da mãe para com o filho.

Em especial duas histórias me chamaram a atenção:
"Presente de Deus" onde ele relata que algumas doenças progridem causando anorexia e cita o caso de um paciente que tinha a refeição como um de seus grandes prazeres na vida e que foi perdendo esse prazer conforme a evolução da doença, sentindo o apetite esvair-se pedia à cozinheira que fizesse pratos diferentes, porém não conseguia sentir prazer em nenhum "instalou-se um conflito acirrado entre a variedade de sabores arquivados em sua memória e a incapacidade progressiva de obtê-los." 
Eu então pensei em quantas pessoas se limitam e passam vontade de comer algo que gostam só para perder 2 quilinhos, se punem com regimes ao invés de desfrutarem do prazer de saborear uma comida que gostam, enquanto podem, enquanto tem saúde
 para isso.

A segunda História; "Os gêmeos" Levaram o pai até o hospital, bancaram todas as despesas médicas, mas nunca o foram visitar, o pai queixava-se com todos pela ingratidão dos filhos e de suas ex-mulheres, todos se compadeciam pelo pobre e solitário velhinho. Os filhos foram chamados ao hospital e lhes foi pedido que ao menos visitassem o pai nos seus últimos dias de vida. O filho respondeu que aquele homem havia abandonado sua mãe logo que eles nasceram, disse a ela que não estava preparado para assumir uma família e que além disso já tinha outra mulher, anos depois eles descobriram o endereço do pai e quiseram conhecê-lo, foram até lá, e o ouviram dizer: "O que querem? Dinheiro? Quem disse que sou pai de vocês? Convivi com vocês menos de um mês, não me sinto pai de ninguém."
Ele não deveria então agradecer pelos supostos filhos estarem pagando seu tratamento ao invés de criticá-los? Afinal, eles não tinham essa obrigação para com alguém que não era seu pai.
Você sente dó de velhinhos? Em especial aqueles solitários que se fazem de vitima o tempo todo? Quem será q essa pessoa foi no passado para estar assim hoje? Antes de ter dó, lembre-se que toda história tem 2 lados e que gente ruim e mentirosa também envelhece.

Bem, concluindo, o livro não é lá uma leitura muito agradável e divertida né? Te faz pensar que determinada situação que você está lendo nesse momento pode acontecer com você amanhã, você pensa no "medo" não da morte, mas do caminho que vai te conduzir até ela, ainda assim é uma leitura que vale a pena, te faz refletir sobre como é bom estar saudável, e quem sabe, dar um pouco mais de valor para as coisas que até então você nem tinha notado que são importantes...

...Como saborear um sorvete sem medo de engordar... ;)