Um blog criado a 4 mãos, uma parceria entre irmãs, para comentarmos sobre os livros que lemos, e compartilhar opções de boa leitura.
Escolha um livro, pegue uma xícara de café e venham me desfolhar, sintam-se à vontade.

quarta-feira, 2 de março de 2016

1968, o ano que não terminou.


Título: 1968, o ano que não terminou.
Autor: Zuenir Ventura
Gênero: Política e sociologia
Ano: Lançado originalmente em 1989
Relançado por diferentes editoras.













1968, um clássico da literatura política brasileira, e como tal, eu esperava mais do livro. Não atoa, sempre criamos grandes expectativas ao ter em mãos um livro conceituado. 
Eu esperava por mais informações políticas, ausente no primeiro capítulo, que se dedica mais a relatar como viviam os jovens daquela geração, o que liam, o que assistiam, sobre o que conversavam, sua busca por liberdade, sexualidade e ideais. Desinteressante, na minha opinião.
Outro ponto negativo é que a maior parte do livro se passa no Rio de Janeiro, enquanto a ditadura se passava no Brasil todo. No decorrer da leitura, me pego pensando no que estaria acontecendo, naquele momento, no restante do país. Como a opressão política atingia os demais brasileiros, nas capitais menos expressivas? Pouco se fala sobre os acontecimentos além do eixo Rio - SP, e essa falta de abrangência nacional deixou a desejar.
Apesar de ser um dos livros mais conhecidos sobre a época da ditadura militar, ele não é um relato exclusivamente político, sobre a ditadura, o AI5 e suas atrocidades, é uma retrospectiva do ano todo, do primeiro ao último dia, desde fatos fúteis, até os mais marcantes. E apesar de cansativa e desinteressante, a primeira metade do livro não deixa de ser um complemento aos demais relatos.
A segunda metade traz vários relatos políticos e sociais, tal qual um trabalho jornalístico. É como ler matérias da época, contadas por quem as presenciou. 
Cita personagens importantes na luta contra a repressão, a censura sofrida por artistas do teatro e da música brasileira, relatos de pessoas que sofreram repressão, relatos de abuso de poder, de autoritarismo, de desrespeito aos direitos humanos e afronta à cidadania e seus direitos democráticos.
A cada página, a leitura vai se tornando cada vez mais interessante, com mais informações e relatos que prendem a atenção, até que o ano chega ao fim, ao menos no calendário, já que historicamente ele não terminou...



Deixo aqui um trecho do livro, cujo a mensagem nele inserida, vai muito além das palavras.

"As 19:30 do sábado, em Goiânia, o calor estava insuportável, e ele resolveu se por à vontade no quarto do hotel. De chinelos, sem meias e com calça de pijama, Sobral repousa sentado, quando, de repente, a porta foi arrombada e apareceu um major. Atrás dele havia seis homens em fila. O major não cumprimentou:
-Eu trago uma ordem do presidente Costa e Silva para o sr. me acompanhar.
Sentado estava, sentado Sobral ficou.
-Meu amigo, o marechal Costa e Silva pode dar ordens ao senhor. Ele é marechal, o sr, major. Mas eu sou paisano, sou civil. O presidente da república não manda no cidadão. Se esta é a ordem, então o sr pode se retirar pq eu não vou.
A primeira reação do militar foi de espanto:
-O sr está preso! Gritou o major, achando q não se tinha feito entender.
- Preso coisa nenhuma!
Só então o major percebeu q precisaria usar a força. A um grito de "prendam", quatro homens se atiraram sobre o velho sentado. Sobral foi agarrado e arrastado até o elevador, agarrado e arrastado passou pelo salão do hotel e, esperneando, foi jogado no banco de trás de um carro.
Ao comandar aquele sequestro, o major certamente aprendeu que a bravura cívica podia ter 75 anos, pesar 67 kgs, e andar de chinelos e pijama."